Homem com H e o desejo de honrar quem se é
Ney Matogrosso fez isso com muita verdade e coragem

No domingo, tive o privilégio de assistir ao filme que conta a história do Ney. Que antes de se tornar Ney Matogrosso, era o Ney de Souza Pereira: um homem que, desde cedo, se sentia diferente de tudo que o cercava e que precisou lutar muito para se tornar quem tanto gostaria de ser. Mesmo em momentos incertos, deu a si mesmo essa chance: a chance de descobrir quem era.
Ney teve uma infância difícil e foi, muitas vezes, violentado pelo próprio pai por não aceitar o jeito dele quando ainda era um menino que nem entendia o que acontecia dentro de si. No fim, acabou sendo uma criança que não conseguiu viver plenamente a infância, muito menos usar seu tempo desenhando as coisas de que gostava. Doeu muito ver o quanto, muitas vezes, os sonhos já nos são tirados ainda na infância. Enquanto via isso na tela, não pude evitar pensar no meu próprio filho, de 8 anos, e na minha própria infância.
Para honrar a si mesmo e por não aguentar mais ser tão violentado, Ney decidiu sair de casa sem nem olhar para trás. A cena em que ele enfrenta o próprio pai, que o chama de gay, é um grito de coragem: ele responde "Eu não sou gay, mas a hora que eu for, o Brasil inteiro vai saber." Uma coragem que, muitas vezes, falta em muitos de nós (falo por mim mesma). Fiquei arrepiada com essa cena, porque, para ser quem ele queria ser, ele precisou dar um basta em tudo o que o reprimia. Inclusive se afastar do pai, para o seu próprio bem.
Essa relação do Ney com o pai me fez pensar em como recebemos uma mensagem distorcida sobre o que é, de fato, honrar um pai ou uma mãe. Parece que existe uma cobrança interna para agradar, a qualquer custo, as pessoas que nos colocaram no mundo. É como se não pudéssemos ser quem realmente somos. Como se precisássemos usar uma fantasia a vida inteira para sermos vistos do jeito que eles querem, e não como de fato somos. É como se tivéssemos que pagar uma dívida eterna com a própria vida. Mas que bom que Ney não foi medroso. Ele foi um verdadeiro herói da própria história, que decidiu, com toda a sua grandeza, seguir os próprios instintos. Ele precisou ser tudo o que queria ser para, no final, o pai finalmente enxergá-lo como o grande artista que sempre foi.

“Homem bicho” é uma expressão que o próprio Ney usou muitas vezes para se referir a si mesmo. Essa ligação dele com a arte, essa forma de ser livre mesmo em tempos sombrios, quando a censura tentava calá-lo e quando quebrar padrões de gênero era ainda mais impensável do que hoje, sempre foi a sua verdade, que falou mais alto. Um homem bicho que revolucionou a arte com suas ideias. Foi muito valente, e olha que nem precisou usar força física para isso.
Ney pode ter sido criticado por muitos, inclusive nos dias atuais, mas nem por um instante se deixou levar ou recuar. Muito pelo contrário: tudo foi muito bem pensado para confrontar mesmo. Tem uma cena do filme em que ele está numa coletiva de imprensa e responde a um dos jornalistas dizendo que as pessoas só se incomodavam porque, de alguma forma, não podiam ser livres como ele era. Na verdade, ele era tudo o que elas queriam ser e, por não poderem, o criticavam. Entretanto, ele sustenta tudo o que sempre foi até hoje. Fico feliz que tenham criado esse filme com ele ainda em vida.
Ainda me sinto anestesiada por todas as emoções que o filme foi capaz de me proporcionar. Para mim, muitas coisas foram inéditas, mas a partir de domingo deixaram de ser. O filme não é para todo mundo, principalmente para as pessoas que, de alguma forma, ainda vivem presas dentro de si mesmas. A liberdade do outro sempre nos incomodará. É um filme que constrange, mas que, ao mesmo tempo, inspira a ponto de gerar um sentimento muito bonito no nosso íntimo. Principalmente o desejo de honrar a si mesmo com a coragem do Ney.
Esse filme também foi um presente para nós, que de alguma forma somos conectados com a arte da escrita ou com qualquer outra arte que faça o coração pulsar mais forte. É um incentivo para continuarmos investindo tempo naquilo em que realmente acreditamos, mesmo quando ninguém mais acredita, sabe? Será a arte a nossa maior força? Enfim, o filme está lindíssimo e o Jesuíta Barbosa deu um show com sua atuação impecável.
Ele apenas ele, Ney Matogrosso.
Mas e você, já assistiu ao filme? Se a resposta for sim, quais sentimentos foram despertados em você?
Um beijo,
Até a próxima edição!
Com carinho,
Bi <3
O filme é uma expressão pura de arte e a vida do Ney representa tanto quando ele só era a fiel às chances de ser quem queria! Depois que terminei essa verdadeira obra de arte, tive certeza que me desdobraria em várias peças, mas não deixaria de pontuar o tanto que representa. Imagino como os pais com crianças pequenas, ao assistir, se viram de uma perspectiva a não podar os que ainda desconhecem o nome do que faz, mas completa de alguma forma o coração dentro de si ❤️.
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